segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Magnolia Nobile eau de parfum - Acqua di Parma


ESPÍRITO DA FRAGRÂNCIA
Magnolia Nobile  foge do tradicional etéreo e cristalino padrão de flores brancas para colorir suas pétalas em matizes cálidos,  em tons de boca.
 Na licença poética, ou perfumada,  abriga o carnal da cútis ruborizada, cujo aroma se espalha junto ao calor brando que emana.
Sua  cor é de verão, lânguido, confortável e elegante acompanhando  a bella dona que se veste com apuro, equilibra  róseo colorido com tons neutros,  estampando o veraneio nos vestidos fluidos, na maquiagem leve e natural.


PERCEPÇÂO PESSOAL
Inicialmente  trouxe  flor cálida e aconchegante repudiando a transparência fresca de alvo bouquet enquanto através da cortina cítrica aflorava doce ardência.
Repetido o contato estes  cítricos ressaltaram, entre véus de agridoce indólico,  denunciando resinas aromáticas,  nebulosas, talvez pela conjunção com vetiver e patchuli,
Dentro deste contexto insinua-se o floral,  temperado e ligeiramente aldeídico revelando a  característica de magnólias, como  sentida em outras fragrâncias do gênero,  embora me falte intimidade com a flor natural.
Entretanto não se manifesta puro, como se tais magnólias se apresentassem  embrulhadas  em papel parafinado, desprendendo fugaz aroma de cera ao contato.
Colorido, o ramalhete é entremeado  pelo  gourmand de uma ou outra rosa,  picância instigante de  angélica  e adocicado  de jasmim. Breves, porém presentes.
Frutas não ácidas se insinuam embora seja difícil definir sua vocação. Existe um ligeiro tom de pêssego nas entrelinhas dos aldeídos florais.
Madeiras  doces com lampejos de âmbar e almíscar envolvem estes acentos,  conduzindo a composição na trilha da elegância floral amadeirada.
Faz parte do trio de eau de parfum inspirados nas flores nobres dos jardins italianos: Magnolia Nobile, Íris Nobile Gelsomino Nobile


PRÓS E CONTRAS
Bouquet rico que evidencia o aroma de magnólia de forma complexa. Apesar da fragrância definida  não se caracteriza aqui a simplicidade de um soliflore.
Entre acordes de saída e coração atravessa  uma fase acre cansativa para meu olfato; contudo na evolução a compensa  com  equilibrado  e amadeirado floral, escapando do trivial excesso doce,  justamente  pela generosidade de patchuli e vetiver e madeiras.
Apesar de leituras indicarem que muitos  sentiram na fragrância  projeção e longevidade média para alta,  na minha pele se tornou branda e intimista  em 4h ou 5h.

SIMILARIDADES OLFATIVAS
Apontadas pela literatura as fragrâncias  Tribu by Bennetton, Carnal Flower by Frederic Malle. Na primeira camada  frutada e cítrica / resinosa, da evolução,  trouxe a tona  memória  do floral frutal  Lyra 3 de Alain Delon,  que se revela mais suave  e almiscarado.


FICHA TÉCNICA
Família olfativa:  Floral frutal, 2009
Gênero: Feminino
Perfumista: Antoine Maisondieu
Designer: Acqua di Parma
Rastro: Intenso
Fixação: Boa
Pirâmide Olfativa:
  • Topo - Bergamota, limão, cidra
  • Coração - Magnolia, rosa da Bulgária, jasmim, angélica 
  • Base - Madeira de sândalo, baunilha, cedro, patchuli e vetiver
Classificação


Arte Irmã
Se fosse uma pintura seria um "Nú" ao estilo carnal de Rubens


Imagens: Composições  com frasco de Magnolia Nobile by Acqua di Parma e magnólias de Aussiegall/flickr , Eyecatcher/flickr por elisabeth casagrande; Frasco de Magnólia Nobili de Acqua di Parma; Pintura de  Rubens.

domingo, 12 de janeiro de 2014

Arpège eau de parfum - Lanvin

Arpége!
Um perfume a contar histórias.
Relata-se que foi uma homenagem de Madame Lanvin aos 30 anos de sua querida filha Marguerite, talentosa musicista.
Entretanto as notas que emanam do lindo frasco idealizado por Armand Rateau, estampando o símbolo do amor materno no elegante design Art-Deco sussurram outras histórias aos meus ouvidos.
Narrações sobre vida aguerrida e vibrante.
Acordes ácidos e cítricos  pincelam o início precoce da grande estilista, nos primeiros passos, aos 13 anos, como modesta aprendiz de costura confeccionando chapéus.


Seguem-se notas cortantes em intensidade aldeídica,  ligeiramente amarga, como a rejeitar lembranças de época tão alvoroçada.
Entretanto sentimos doçura  na rosa e ylan-ylang que afloram comprovando a impossibilidade de atribulações sufocarem a alegria espontânea da quase criança.
Vida difícil na virada do século, acompanhando o avançar da industrialização numa Europa  repleta de perturbadoras mudanças.
E num mundo tão masculino...levemente refletido na evolução de Arpège..
Trajetória de trabalhos exaustivos, provavelmente alguns sacrifícios, moldaram a fibra resistente  da pequena Jeanne encontrando reflexo  na intensidade especiada e resinosa que podemos apreciar na fragrância.
Arpejo musical, onde notas são tocadas uma a uma, como em sequência biográfica, relatando a progressão de uma vida.
Maturidade profissional, amor e maternidade explodem num bouquet encantador.
sucesso vivificado na doçura dos acordes que nos dizem...finalmente novos tempos brindaram aquela que chamam de Madame Lanvin

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb08X9BobGicFNFeXx7olp-P7BfD21_komRo1tvZ7OmS_2rV5_-7Q08I583z_cU7ZX6yGKYNfOFyySHiPWqsuTAVgwu17qK5Vnay9Tob0gw1kUhx9pBoTNbh0Fv4tpoTfx_doBWUC4qURq/s1600-h/Moda+Jeanne+Lanvin+annees20.gif

Vida intensa que continuaria pontilhada por acontecimentos vibrantes, espelhados na profundidade das notas agrestes deste perfume clássico.
Cotidiano suavizado  abrindo espaço para a ternura, como a doce cremosidade da baunilha em macias e empoeiradas notas de sândalo e âmbar  burilando o verde terroso, apimentado e incensado de patchuli, vetiver e benjoim.
Finalmente encontra sua definição no final de aroma limpo, almiscarado,em mansidão não submissa porém confortável, como se a retrospectiva mostrasse missões cumpridas.


Uma vida pródiga!
Será assim? Pouco conheço desta história, além das informações truncadas que circulam pela nossa globalidade. Entretanto agrada-me pensar que sim. Imaginar que esta talentosa senhora Lanvin, em algum lugar, onde sua essência permanece vívida, sorri complacente e assertiva da minha imaginação pueril.


Família Olfativa: Floral aldeídico,1927
Gênero: Feminino (compartilhável)
Perfumista: André Fraisse e Paul Vacher
Rastro: Intenso
Fixação: Ótima
Pirâmide Olfativa:
  • Topo - Aldeídos, tangerina, neroli
  • Coração - Rosa, ylang-ylang, íris, jasmim, cravo, gerânio, angélica, lírio-de-maio, coentro
  • Base - Patchuli, vetiver, sândalo, baunilha, stirax.

Arte Irmã: Se fosse música seria  Blues In The Night  na voz de  Katie Melua


Imagens: Frasco Arpège -foto Elisabeth Casagrande;  Publicidade Lanvin - Arpege 1927; Modistes Lanvin mlimers-1930; Desenhos da coleção lanvin -anos 20; Ícone Lanvin-Paris , 6 de julho 1946

PS: Reprodução da postagem original de 15 de abril de 2009 em Perfumes Bighouse.

sábado, 11 de janeiro de 2014

Olfato de Perfumista

Olfato de perfumistas, de críticos, de estudiosos, aromaterapeutas,  químicos,  blogueiros, colecionadores....
O que tem em comum? ou diferente?
Simplesmente  são narizes que vivem mergulhados em cheiros, de forma inusitada.
Os odores não chegam naturalmente no decorrer do tempo. São constantemente buscados por eles.
Instintiva, automática e continuamente criando um hábito.
Como evolui a percepção olfativa em narizes tão fatigados?
Prática e sabedoria popular nos dizem que percebemos cheiros de forma diferente. A ciência quase concorda.
Noutro dia discutindo temperos (frescos) com uma garota da família me deparei com quatro opiniões sobre coentro.
Para meu olfato e paladar é uma das ervas mais quentes, picantes e densas da cozinha, usada com parcimônia enquanto para ela e uma amiga se mostra intensa, fresca e mentolada.
Contudo numa quarta opinião,  de amigo também inclinado para as artes da culinária, se define  apimentada, cálida e excessivamente marcante.
Divaguei com meus botões que diferentes combinações genéticas provavelmente levam a diferentes percepções olfativas!
Aqui são  dois grupos bem distintos sobre o coentro: Mentolado Fresco versus Acre Apimentado.


A composição química  do Coriandrum sativum revela presença de taninos, pectinas, alcalóides, fenilpropanóides, cumarinas, cânfora, geraniol, borneol, anetol e linalol.
Muitos destes compostos odoríferos  estão presentes em outras ervas com diferentes personalidades aromáticas.
Além disto Coriandrum sativum pertence a família Apiaceae que abriga as espécies de erva-doce, funcho, cenoura, alcarávia, aipo e cominho, plantas com características diversas.
Assim constatamos algumas moléculas aromáticas comuns  em várias espécies botânicas diferentes.
A nuances de percepção olfativa referentes ao coentro, entre outras, talvez se deva ao fato de que algumas destas moléculas falam mais alto ao meu nariz que as demais. E, que outras sejam ressaltadas em  narizes, como nos das duas jovens que percebem  aroma de menta.
Tal diversidade sensorial pode ser determinada geneticamente, apesar de existirem fatores ambientais e fisiológicos, incluindo variações hormonais, a serem considerados. Exemplo disto é a extrema e modificada sensibilidade olfativa ou gustativa de gestantes e mulheres na TPM.


Minha filha sente (e aprecia) os perfumes de forma radicalmente diferente da minha e certo dia afirmou que meu nariz deveria ter se "estragado"de tanto que cheiro perfumes.
Existe algo plausível aqui.
É possível que meu cérebro enfastiado registre pouco alguns elementos olfativos muito comuns (acomodação ou fadiga olfativa), abrindo espaço para que eu perceba com mais acuidade o que  não sentia anos atrás.
Isto é problemático!
Neste caso, nos perfumes  eu sentiria de imediato com menor intensidade  o que  muitos  sentem fortemente, e  registraria  em substituição o que muitos percebem após algum tempo.
Dio Santo!
Se hipotéticamente isto ocorre com uma  exploradora e colecionadora de perfumes, o que não aconteceria com um perfumista?
Perfumistas que catalogam e diferenciam milhões de moléculas olfativas devido ao olfato privilegiado e educado,  narizes capazes de  diferenciar ínfimos matizes, e produzir as preciosidades que nos encantam...
Seria este um dos possíveis atalhos a produzir novos caminhos?  Nariz "estragado" pelo tanto que sentiram?
Olfato ainda constitui um grande mistério, pois não podemos ter  certeza de que o aroma por nós  apreendido se revela da mesma forma para o próximo.
Quantos milhares de padrões sensoriais  perceptivos existirão?
Será que o meu e o seu coentro são únicos? E assim com tudo mais?

Vídeo: Canto Alentejano na Adega Velha Acorda de Coentro e Alhos


Imagens: Globo de Catherine nelson; Coriandrum sativum - photo Henriette Kress; Smell The Flowers de Maria Katra

Eternity Women - Calvin Klein


ESPÍRITO DA FRAGRÂNCIA 
Não imagino  o porquê, porém  na minha mente  Eternity Women de Calvin Klein era  fragrância fadada ao verão, e saí usando  num dia  muito quente e abafado.
Erro!
Picância melífera determina  aroma para saborear ares de primavera, recebendo brisa  teimosamente fria embora haja o despertar das flores.
Veste floral, godet,em fundo creme, com pequenas folhas verdes e flores coloridas em açafrão e bordô, sob casaquinho de malha leve, quase uma renda. Acompanhado por  sapatilhas rasas e não pé descalços, dos que  correm livres sobre a grama fofa  ou areia morna...
Cabelos ondulam com a brisa  e sorriem para o sol cálido, ainda tímido.
Foi idealizado para simbolizar um casamento.
Sim! Ficaria lindo numa cerimônia campestre, primaveril, sob tendas românticas e árvores frondosas.


PERCEPÇÂO PESSOAL
Breve acidez, beirando o frescor, abre o leque  inicialmente verde de flores doces e picantes.
Evolui fiel na descrição associando  rosas e heliotrópio, que já li referido apropriadamente como jasmim chocolate.
A doçura deste encontro denota  toques de mel e sândalo, continuamente sob o jugo de picância ligeiramente canforada,  minimamente indólica.
Lírios assomam eventualmente.
Pressinto, ao fundo, notas verdes de patchuli, apesar das  violetas não revelarem seu frescor úmido.
Faz-se necessário mergulho profundo para decifrar  nesta instigante provocação  nuances explícitas de cravo ou narciso, sob as camadas doces de almíscar e âmbar, embora o teor  de flores apimentadas marque presença todo tempo.
Existe constância na base densa  enquanto notas do bouquet  se enovelam revelando facetas personalistas  com muita rapidez
O ramalhete é impreciso, porém harmonioso e elegante em Eternity  eau de parfum,  um clássico singular da maison Calvin Klein.


PRÓS E CONTRAS
Consagrado há décadas, pelo aroma delicioso e refinado apresenta o cheiro de uma época. Entretanto as inúmeras similaridades, que não captam toda sua luz, provocaram a banalização da fragrância.

SIMILARIDADES OLFATIVAS:
Além dos similares  contratipos e  diversos produtos florais do mercado em geral, comentários sugerem proximidade olfativa em  Sun Moon Stars de K Lagerfeld, Séxùal de Michel Germain, Zinnia de Floris, Kashaya de kenzo e Paris de YsL.


FICHA TÉCNICA
Família Olfativa: Floral,1988
Gênero: Feminino
Perfumista: Sophia Grojsman
Designer: Calvin Klein
Rastro: Intenso a moderado
Fixação:  Muito Boa
Pirâmide Olfativa:
  • Topo - Cítricos, notas verdes, tangerina, frésia, sálvia
  • Coração - Lírio, cravo, violeta, jasmim, calêndula, lírio-de-maio, rosa, narciso
  • Base -Madeira de sândalo, âmbar, patchuli, almíscar, heliotrópio
Classificação

Arte Irmã:
Se fosse  quadro seria um jardim de Claude Monet.
Imagens: Miniatura de Eternity-foto Elisabeth Casagrande, Monet Garden in Argenteuil Sun - wikimpaintings,

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Diário de Um Perfumista - Jean-Claude Ellena

Não leio um livro, desvendo o homem perfumista.
Talvez este seja o motivo do vagar. Geralmente devoro livros numa madrugada, ou entre um almoço e jantar, entretanto  aqui me detenho há dias.
Cada página ou pequeno capítulo deste diário me faz parar. As vezes longamente reflexiva, noutras distraída na inquietação de  breves instantes .
Sou a blogueira, a que descreve de forma amadorística  sensações provocadas pelos perfumes, representando  outra visão,  outro lado da moeda.
Causa-me timidez isto.
Não conseguirei mais ver meus escritos da mesma forma. Li palavras que existiam no meu íntimo e brotaram através de outro, concretizei conceitos antes etéreos,  pressentidos,  o que provocou  novo olhar para a  perfumaria.
Quanto mais aprendo mais sei que nada sei.
Pulsou firme um desejo...talvez em outra vida eu me transforme numa perfumista, se a sociedade assim o permitir, talvez nesta eu  crie um perfume. Tosco, balbuciante, disforme e bonito para minha janela interior..
É possível que  nunca mais me atreva a julgar ou descrever perfumes ou provavelmente desande entusiasmada a registrar minhas rudes impressões. Somos seres imprevisíveis.
Apesar  destas consequências o  livro me fascina, assim como outros lidos a pouco, versões sobre o mesmo tema; o  labirinto emocional  complexo  do qual perfumistas se alimentam,  vivendo nesta arte que tenta apreender ou absorver a  abstração  sensorial que nos acompanha desde sempre.
Não é um livro comum. Desnuda, revela e provoca familiaridade.
Surpreendentemente não li ainda o Breviário dos Aromas o que imaginei seria a primeira ávida procura, pois não é incomum que eu leia as obras do avesso,  e nós amadores somos incautos seduzidos pelos conceitos aromáticos.
Contudo negligentemente caí na primeira página e segui dia após dia, companheira constante deste diário sonoro, colorido e perfumado.
Não terminei, ainda leio, apenas fiz  breve pausa para transcrever  um pouco do  que percebi  do retrato de um homem... perfumista:


"- Fujo do sol procurando  a sombra dos bosques. Se o aspecto lânguido das praias me deixa entediado as enseadas e os recifes me atraem. Gosto do mar e do seu horizonte quando meu olhar se perde e o azul do céu e do mar se confundem.

- A maior parte  das ideias são consequência de  de um trabalho assíduo e cotidiano, resultado as vezes de encontros, de passeios, de vagabundagens, de leituras, de momentos de disponibilidade do espírito.


- Acredito contudo, que a melhor situação para desenvolver a criatividade é  a de trabalhar sozinho e sem uma avaliação, o que não significa sem diálogo. Mas estar só  é também saber administrar a solidão, e o risco de perda de ânimo que pode se associar a ela. Vivo esta solidão como uma liberdade escolhida.

- Nunca procurei impor, minha busca é guiada pela preocupação constante de encontrar o equilíbrio entre o sensível e o inteligível. Sou mediterrâneo.


- Sei que a palavra e mais ainda os odores não tem o mesmo significado  para cada um de nós; contudo os odores são objetos que os perfumistas podem transformar, reviver, mudar. É justamente porque  mudam de sentido que eles vivem."

Cabri, uma semana em agosto de 2010.

Vídeo: Jour d'hermès - Interview Jean-Claude Ellena


Imagens: Livro em foto de Elisabeth Casagrande, Jean Claude Ellena bureau,